Os impactos negativos nas atividades empresariais de produção e circulação de bens e serviços causados pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19) fizeram o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) editar o Provimento CG nº 11/2020, que criou um projeto-piloto de conciliação e mediação pré-processuais para conflitos empresariais decorrentes desses efeitos no Estado. Todo o procedimento será virtual (as audiências serão realizadas pelo Microsoft Teams) e a previsão é que o projeto vigore por até 120 dias após o encerramento do sistema de teletrabalho adotado pelo tribunal.
De acordo com o Provimento, o procedimento é simples e tem apenas três etapas. Primeiro, a parte interessada faz o pedido por e-mail (cerde@tjsp.jus.br), no qual deverá conter a sua qualificação, documentos de identificação, causa de pedir e pedido. Recebido esse e-mail e preenchidos tais requisitos para a sua admissão, dá-se início à segunda etapa, com o agendamento de uma audiência de conciliação em até sete dias. Por fim, se não houver acordo nessa audiência, o caso é encaminhando para um mediador empresarial, que poderá ser escolhido de comum acordo pelas partes ou, se isso não for possível, pelo juiz.
Em que pese a clara boa vontade dessa iniciativa para tentar ajudar empresários a resolverem impasses negociais e, assim, dar fôlego à economia e atenuar o risco do colapso do serviço judicial em um futuro breve, o Provimento não parece claro o suficiente sobre aspectos fundamentais. Aspectos práticos, como, por exemplo, a forma de instrumentalização de tal pedido e de participação do advogado, e aspectos jurídicos, como os efeitos sobre a prescrição e a decadência do direito das partes ou ainda sobre a não realização de um acordo.
Ainda mais nos dias difíceis pelos quais estamos passando, são inegáveis e cada vez mais alardeados por especialistas os benefícios do incentivo da utilização de formas de resolução de conflitos, em especial como a mediação, para a saúde do relacionamento entre as partes e estrutura judiciária brasileira, assim como de qualquer ordenamento jurídico no mundo.
Entretanto, dentre outros, os motivos exemplificados acima têm rendido severas críticas ao Provimento, antes mesmo de serem apurados os seus resultados, até porque o nosso sistema legal já possui todos os instrumentos destinados à implementação da conciliação e da mediação, em âmbito privado ou institucional. Assim, apesar da sua boa vontade, parece que o referido projeto-piloto pode gerar mais dúvidas do que soluções e, nessa medida, talvez confirmar o dito popular que “de boas intenções o inferno está cheio”.
por Gustavo Milaré Almeida é é advogado, mediador privado e sócio do escritório Meirelles Milaré Advogados;
e João Pedro Alves Pinto é advogado associado do escritório Meirelles Milaré Advogados