A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) divulgou recentemente os dados do relatório anual sobre o Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo. E pela primeira vez o número de obesos (830 milhões) superou o de famintos (820 milhões).
De acordo com a agência da ONU, há relação direta entre insegurança alimentar e obesidade e o vilão dessa equação é o alimento ultraprocessado. Confirmando a tendência mundial, no Brasil, dados do Ministério da Saúde apontam para crescimento de 67% no número de obesos entre 2006 e 2018, maior índice em 13 anos.
“Vivemos novamente um grande dilema. A população aumenta e não se consegue produzir alimentos de “forma natural” que abasteça e alimente a todos, aí sugere-se que precisamos dos alimentos industrializados. Por outro lado, esses alimentos são os grandes responsáveis pelo aumento da ingestão de sal, gorduras e açúcares que consequentemente levam à obesidade e suas doenças associadas.
A maior parte da população mundial e do Brasil é de pessoas de baixa renda, que são o principal mercado consumidor dos alimentos ultraprocessados, por serem mais baratos e na maior parte das vezes não perecíveis. Na tentativa do equilíbrio orçamentário dessas famílias, com certeza essa é a “alimentação” de escolha”, destaca o médico Cid Pitombo, especialista no tratamento da obesidade e coordenador do Programa de Cirurgia Bariátrica do Estado do Rio de Janeiro.
O fato é que uma em cada cinco pessoas está obesa no Brasil e mais da metade da população está com excesso de peso, tornando a obesidade uma epidemia e um problema real de saúde pública. Pitombo alerta para a necessidade de políticas públicas de controle do alimento industrializado, como já fazem alguns países com importantes resultados.
“O Governo deve atuar na garantia do bom hábito alimentar em escolas, na orientação às famílias sobre correto uso de alimentos e no controle do acesso ao alimento industrializado, que claramente, por ser mais barato, de baixo valor nutricional e alto valor calórico, leva a um sério problema de saúde pública que é a obesidade. O Estado precisa intervir neste lado.
Prevenção com hábito saudável de alimentação, mais acesso a possibilidades de atividade física na boa orientação às famílias”, destaca Cid Pitombo.
Biscoitos, refrigerantes e macarrões instantâneos, apesar de serem barato, não ajudam a nutrir e tem alto valor calórico. O especialista defende que essa luta precisa ser travada pelo Estado brasileiro, a fim de melhorar a condição de acesso aos alimentos saudáveis, em preço, até com subsídios, para que a família possa ofertar às crianças opções melhores.
Mortes por obesidade triplicam no Brasil em 10 anos – O número de brasileiros mortos por complicações diretamente relacionadas à obesidade triplicou em um período de dez anos no país, com base em informações do Datasus.
Perfil do especialista – Cid Pitombo é especialista no tratamento da obesidade, atuando na sua clínica particular e no Sistema Único de Saúde. Coordena desde 2010 o Programa Estadual de Cirurgia Bariátrica do Rio de Janeiro, sendo o recordista de cirurgias por videolaparoscopia no SUS. Mais de 2.800 pessoas de todo Rio de Janeiro já foram operadas pelo profissional.
Há quase 25 anos, ao sair da faculdade, Cid Pitombo foi para os Estados Unidos se especializar em cirurgia laparoscópica. Voltou ao Brasil cinco anos depois para aprender sobre cirurgias da obesidade e, ao final do mestrado e doutorado, rodou grandes centros de cirurgia bariátrica nos EUA. Logo percebeu que os conhecimentos sobre laparoscopia e obesidade eram uma área a ser explorada. Juntou-se aos grandes nomes da cirurgia bariátrica, experimentou diferentes técnicas, operou e deu aulas em diversos países e se tornou referência no Brasil em cirurgia bariátrica por videolaparoscopia, técnica que utiliza em todas as unidades em que opera. O procedimento é menos invasivo e proporciona recuperação mais rápida do paciente.