Professor Titular da Universidade Federal do Maranhão, Dr. João Batista Santos Garcia reforça habilidades para tratar além dos sintomas físicos
Cuidado paliativo é uma abordagem que melhora a qualidade de vida de pacientes e familiares diante de doenças que ameacem a continuidade da vida, por meio do alívio do sofrimento, tratamento da dor e de outros sintomas de natureza física, psicossocial e espiritual. Em virtude desse perfil multiprofissional, o potencial da especialidade ganha destaque como opção de carreira na área de saúde.
Isso porque estima-se que no Brasil, segundo dados da última edição do Atlas dos Cuidados Paliativos no Brasil (2022), organizado pela Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), mais de 600 mil pessoas, entre adultos e crianças, demandem assistência em cuidados paliativos todos os anos.
Além disso, este ano é considerado um marco histórico para a especialidade, com a criação da Política Nacional de Cuidados Paliativos (Portaria GM/MS nº 3.681, de 7 de maio de 2024), que inova ao contemplar importantes ações, dentre elas, a criação de equipes matriciais e assistenciais em todo o território nacional, aumentando o número de serviços de cerca de 300 para 1.200, a capacitação de profissionais de saúde em cuidados paliativos, principalmente na atenção primária, e a melhoria do acesso a medicamentos.
As oportunidades, entretanto, são proporcionais aos desafios da formação e ao nível de exigência na área, segundo João Batista Santos Garcia, diretor científico da ANCP e professor Titular da Disciplina de Dor e Cuidados Paliativos da Universidade Federal do Maranhão. “Antes de tudo, o profissional deve buscar aperfeiçoamento adequado, ter uma formação científica sólida, em centros de excelência que ainda não são muitos no Brasil”, diz o especialista, que é também o primeiro brasileiro a ser “enlace da dor” entre a América Latina e a IASP (Internacional Association for the Study of Pain).
“Muitas habilidades são exigidas para o tratamento de sintomas físicos. E nessa parte, em geral, o médico é muito bem treinado. Contudo, nós precisamos de mais que isso. No cuidado paliativo, a abordagem psicossocial, existencial e espiritual é extremamente importante. E é aí que entra a nossa equipe multiprofissional”, explica Garcia.
Em relação a especialidades para compor essas equipes multifacetadas, que podem ser demandadas nos próximos anos, Garcia cita enfermagem, psicologia, nutrição, fonoaudiologia, assistência social, fisioterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia e orientação espiritual, dentre outras, que conjuntamente garantem qualidade ao atendimento. “A junção das áreas de conhecimento é que faz com que o cuidado paliativo seja mais bem exercido. Todos esses saberes, dentre outros, é que realmente fazem a diferença”, destaca.
Ele destaca uma habilidade fundamental a quem quer seguir a carreira, tanto na formação médica quanto na geral do paliativista, seja da equipe médica ou multiprofissional: a comunicação. “Isso precisa ser realmente treinado e retreinado. É essencial ter uma comunicação eficiente, compassiva, adequada e que possa chegar ao nosso paciente da melhor maneira.”
Ainda na visão de Garcia, o ritmo de criação de cursos de graduação e pós-graduação em cuidados paliativos, infelizmente, não é adequado no Brasil, mesmo com a determinação de que a especialidade precisa ser ensinada nos cursos de graduação. “Alguns cursos de medicina já têm a disciplina de cuidado paliativo. Na Universidade Federal do Maranhão, onde sou professor, ela é obrigatória há vários anos, dura um semestre inteiro, mas trata-se de uma realidade muito diferente do Brasil afora”, afirma.
“Em relação à pós-graduação, o quadro também é dramático. Nós não temos vagas de residência médica e também multiprofissional que atenda, por exemplo, a demanda de profissionais que nós necessitamos, não só agora, mas no futuro próximo”, analisa.
A educação de qualidade em Cuidados Paliativos é uma preocupação da ANCP. “A transformação da Medicina Paliativa de área de atuação para Especialidade Médica é uma necessidade urgente e que necessita seguir o exemplo da enfermagem, que em 2022 certificou os primeiros enfermeiros especialistas em Cuidados Paliativos”, avalia o presidente da entidade, Dr. Rodrigo Kappel Castilho. “A ANCP também obteve sucesso em auxiliar a modificar o tempo de formação médica durante a residência de um ano para dois anos, construindo uma matriz curricular detalhada e de qualidade para a adequada formação deste profissional”, ressalta Castilho.
A fim de proporcionar mais oportunidades de qualificação e networking na área, a ANCP vai realizar, entre os dias 13 e 16 de novembro de 2024, em Fortaleza (CE), o X Congresso Brasileiro de Cuidados Paliativos, principal encontro nacional abordando o tema, com 121 palestrantes confirmados, de cinco países.
“Um congresso como esse tem o potencial de oferecer networking de maneira intensa, porque reúne profissionais de diversas áreas e saberes, palestrantes nacionais e internacionais, que sabidamente têm experiência e peso científico na área de cuidados paliativos. A quem participa é uma chance de, no futuro, consultar alguém, dividir casos, discutir, fazer intercâmbios, inclusive estágios no Brasil e fora dele”, destaca Garcia.
Apesar do aumento de profissionais que se dedicam aos cuidados paliativos, ainda é um número insuficiente, assim como o de serviços. “Infelizmente, não é uma realidade somente do Brasil. Cerca de 80% dos pacientes que precisam de cuidados paliativos no mundo não são atendidos, é um número extremamente alarmante”, conclui o diretor médico da ANCP.
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