Realizado pelo Instituto Alana e pelo Instituto Ar, levantamento traz níveis limites e exemplos de ações para proteger a saúde das crianças e adolescentes durante episódios de poluição em nove países, incluindo o Brasil
Na mesma semana em que diversas cidades brasileiras registram altos índice de poluição, ocasionados, principalmente por conta do tempo seco e das queimadas, o Instituto Alana e o Instituto Ar lançam o estudo “Qualidade do ar em alerta”, uma análise comparativa dos níveis críticos e planos de emergência entre o Brasil e outros oito países: Chile, Colômbia e Equador (América do Sul), Estados Unidos e México (América do Norte) Espanha, França e Inglaterra (Europa).
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), 50 mil brasileiros morrem todos os anos por causa da poluição atmosférica, que representa, hoje, o maior fator de risco ambiental para a saúde humana. Para se ter uma ideia da gravidade da situação, o Brasil ainda segue padrões de qualidade do ar estabelecidos em 1990. E mesmo com índices de poluição até cinco vezes mais altos do que nos países analisados no documento – somos superados apenas pelo Equador – raramente os níveis estabelecidos são alcançados, por serem muito brandos e defasados.
O estudo, coordenado por Evangelina Araújo, especialista em qualidade do ar e diretora executiva do Instituto Ar, apresenta referências de níveis de episódios críticos de poluição do ar adotados em diferentes países e medidas de mitigação e adaptação de episódios críticos de poluição do ar vigentes, além dos protocolos específicos utilizados para proteger os grupos mais vulneráveis, como as crianças.
O relatório destaca as principais leis internacionais de qualidade do ar e mostra exemplos de planos e suas respectivas ações para o enfrentamento de episódios críticos de poluição. Entre as sugestões apresentadas no levantamento para proteger as crianças durante os episódios críticos de poluição está o fechamento imediato de escolas em zonas de risco.
No último dia 18, o nível de qualidade do ar no bairro do Grajaú, em São Paulo (SP), ultrapassou o nível estipulado para o “alerta”, superando 212µg/m³ de micropartículas poluentes. Em abril, a mesma situação foi registrada em Boa Vista (RR), que atingiu picos de poluição de 317µg/m³ e, em outubro de 2023, a fumaça gerada pelas queimadas florestais sufocou a cidade de Manaus (AM). À época foi considerada a terceira cidade com o ar mais poluído do mundo com 499µg/m³ de poluentes, o dobro do limite do Índice de Qualidade do Ar (IQAr) estabelecido para o estado de “emergência”. Para efeitos de comparação, a OMS considera aceitável até 15 µg/m3 de poluição.
As três situações têm em comum que nenhum protocolo foi adotado para reduzir os impactos causados na saúde, principalmente das crianças. “Com cada vez mais frequência, cidades brasileiras registram casos em que o excesso de poluentes forma verdadeiras cortinas de fumaça, fenômeno que chamamos de episódio crítico de poluição do ar. E até hoje não temos recomendações ou protocolos do que deve ser feito nessas situações para que a população não seja tão prejudicada, em especial as mais vulneráveis, como as crianças”, diz JP Amaral, gerente de Natureza do Instituto Alana.
O estudo traz possíveis soluções que podem ser inspiradas em medidas já adotadas internacionalmente. Na Colômbia, país vizinho ao Brasil, existe o Plan para la atención de episodios de contaminación del aire de la área metropolitana de Bucaramanga (CDMB), que contempla ações imediatas para a proteção das crianças em casos críticos de poluição. Quando o IQAr está em “alerta”, as escolas suspendem as aulas em toda a área que está dentro desse nível específico de concentração de poluentes. No caso de “emergência”, a ordem é a mesma e, em alguns casos ocorre, inclusive, a evacuação de toda a população exposta à poluição no perímetro.
Nos Estados Unidos, pelas indicações do Air Now, existem diretrizes voltadas a ações gerais e outras específicas para as escolas. As recomendações e atenções iniciam no nível de qualidade do ar “moderado”, quando o tempo e a intensidade das atividades ao ar livre são reduzidas.
Já nas Astúrias, na Espanha, os “programas estratégicos horizontais” apresentam ações para a melhoria da qualidade do ar a longo prazo e não apenas durante episódios críticos. Por lá, o objetivo é criar uma ação de proteção para os grupos sensíveis a partir dos resultados de pesquisas epidemiológicas feitas em áreas prioritárias, como as zonas escolares e, assim, determinar os planos de vigilância epidemiológica de modo mais assertivo.
Em Londres, a estratégia também ocorre a longo prazo: dentro do Plano de Ação de Qualidade do Ar foi elaborado o Health School Street, que adota uma série de medidas, como a diminuição do tráfego veicular, implementação de ciclofaixas, áreas verdes e parques. A iniciativa também busca reduzir a poluição do ar dentro e no entorno das escolas, que têm índices medidos a partir da implementação de sensores que monitoram a qualidade do ar.
“O nosso país está atrasado nesse debate em relação a outras nações, inclusive da América do Sul. O Brasil tem o dever constitucional e moral de combater a poluição e mitigar episódios críticos de modo a garantir saúde e qualidade de vida para as crianças e para toda a população”, finaliza JP Amaral.