As doenças respiratórias são altamente prevalentes no Brasil e consideradas a terceira causa de mortes no país. Estima-se que 17% dos adultos brasileiros tenham doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e 20 milhões, asma. Embora ainda não exista cura para elas, há diversos tipos de tratamento disponíveis, inclusive no sistema público de saúde, que melhoram os sintomas e proporcionam o controle dessas condições. Porém, o desafio de tratar as doenças respiratórias começa pelo subdiagnóstico: apenas 12% das pessoas com DPOC, por exemplo, são devidamente diagnosticadas. Como consequência do subdiagnóstico e tratamento inadequado, tanto pessoas com asma quanto com DPOC frequentemente buscam atendimento nas emergências em crises respiratórias.
Idealmente a maioria dessas pessoas poderia estar adequadamente tratada, fazendo acompanhamento na Atenção Primária da Saúde (APS). Dra. Angela Honda, médica pneumologista e líder de Programas Educacionais da Fundação ProAR, destaca a importância de educar a população sobre os fatores de risco, como tabagismo e comorbidades, e chamar a atenção para a gravidade das doenças respiratórias quando não identificadas e tratadas adequadamente.
O diagnóstico de doenças pulmonares é feito com base em sinais e sintomas respiratórios, presença de fatores de risco, e confirmado com a espirometria, exame que além de diagnosticar também determina a gravidade da condição. Mas é preciso investir em espirômetro nas unidades básicas de saúde e na capacitação de profissionais de saúde, como afirma a Sra. Karina Mauro Dib, responsável por condições crônicas na Atenção Básica da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo (SMS-SP): “Além de ampliar o acesso ao diagnóstico em tempo oportuno, identificar os fatores de risco e melhorar a adesão ao tratamento medicamentoso e não medicamentoso é importante capacitar as equipes de saúde sobre essas condições, pois o subdiagnóstico é decorrente do baixo conhecimento sobre a doença por parte dos profissionais da APS”. A falta de espirômetros nas unidades de saúde também agrava a situação.
Alguns programas vêm alcançando resultados positivos e ajudando a construir um caminho de melhoria do cenário em que as doenças respiratórias figuram, sobretudo depois da pandemia de COVID-19. Um desses programas, implementado tanto na APS da capital de São Paulo quanto em outros municípios, através de parceria público-privada, permitiu aumento de 120% na realização de espirometrias nas unidades básicas de saúde da capital paulista, desde o início da pandemia de COVID-19. Segundo a Sra. Karina, entre junho de 2021 e novembro de 2022 foram feitos 16.123 exames e a previsão para 2023 é realizar 19.500 exames de espirometrias e seis mutirões. Para a expansão desse programa, os profissionais de saúde da APS estão sendo capacitados na modalidade à distância, por meio de videoaulas, numa plataforma própria da Escola Municipal da Saúde.
Dra. Eliane Mancuzo, médica coordenadora do Laboratório de Função Pulmonar do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC-UFMG), também defende o treinamento remoto de técnicos da saúde como parte da solução para facilitar o acesso ao diagnóstico das doenças respiratórias e melhorar o tratamento através da APS. Um sistema nacional de tele-espirometria implantado pelo HC-UFMG, a partir de uma parceria com o Ministério da Saúde, teve início em novembro de 2021. A princípio eram 100 municípios brasileiros recebendo espirômetros e 100 profissionais de saúde treinados. Recentemente ampliou-se com a aquisição de mais 70 espirômetros e treinamento de outros 70 técnicos, totalizando cerca de 4 mil exames já realizados. “O técnico faz a espirometria no município e encaminha pela plataforma Telessaúde. A equipe de pneumologistas do HC-UFMG analisa e emite o laudo, devolvendo-o à APS”, explica Dra. Eliane. Segundo ela, outro componente essencial é a teleconsultoria, através da qual o pneumologista que prepara os laudos pode esclarecer qualquer dúvida que os técnicos da APS apresentem. Ele complementa que “o projeto mostrou ser possível treinar um profissional não especialista para fazer espirometria com qualidade”.
Com o objetivo de aprimorar os serviços voltados à saúde respiratória no país, a Sra. Flávia Lima, presidente da Associação Brasileira de Apoio à Família com Hipertensão Pulmonar e Doenças Correlatas (ABRAF) sugere que “as pessoas com essas condições crônicas sejam mais ouvidas e, com isso, suas dificuldades e necessidade principais identificadas e valorizadas no planejamento de ações e políticas de saúde”. De acordo com o Dr. Mark Barone, coordenador geral do FórumDCNTs, “é exatamente essa associação entre programas de qualidade, integração entre os níveis de atenção e trabalho intersetorial, que inclua a participação do usuário, que nos permitirá avançar e tirar as doenças respiratórias crônicas de disputar a liderança entre as doenças que mais causam mortes prematuras no país”.