O Brasil é o 6º país com maior número de casos de diabetes no mundo: cerca de 16 milhões, 25% a mais do que os habitantes de São Paulo, cidade brasileira mais populosa. Fazer o diagnóstico precoce é um dos principais desafios, segundo o Dr. Mark Barone, Vice-presidente da Federação Internacional de Diabetes (IDF) e Coordenador Geral do FórumDCNTs. De acordo com a IDF, 32% dessas pessoas não sabem que têm a condição, pois o diabetes tipo 2 (DM2) costuma ser assintomático nos primeiros anos, e quando os sinais aparecem geralmente vêm acompanhado de alguma complicação. Da mesma forma, indivíduos com diabetes tipo 1 (DM1) também podem desenvolver complicações, como doença renal ou ocular, por falta de gerenciamento adequado. O relatório T1D Index, divulgado pela JDRF International, mostra que uma em cada três pessoas diagnosticadas com DM1 no Brasil não ultrapassa os 55 anos de idade. Os dados preocupam especialistas, gestores e líderes em saúde no Brasil, afinal o diabetes é uma condição crônica não transmissível (CCNT) altamente prevalente, que hoje está presente em mais de meio bilhão de pessoas no mundo.
A situação se torna mais grave se considerarmos que o diabetes tipo 2, que representa mais de 90% dos casos, está interconectado a síndromes metabólicas que aumentam as chances de desenvolver doenças renais, cardíacas, AVCs, entre outras. O Dr. Mark defende que o Brasil invista mais em campanhas de conscientização da população em geral e de educação em saúde para pessoas com CCNTs e profissionais de saúde. “Precisamos reduzir riscos de obesidade, diabetes, dislipidemia e hipertensão arterial através de hábitos saudáveis, assim como fazer diagnosticar e iniciar o tratamento de CCNTs prontamente”, diz o especialista. Um exemplo dessas campanhas acontece em novembro, por ocasião do Dia Mundial do Diabetes. O tema deste ano expressa bem esta mensagem: Educação para Proteger o Amanhã, revelou Dr. Mark durante evento online realizado pelo FórumDCNTs. Ainda em novembro, outro evento teve como objetivo identificar os desafios e compartilhar estratégias propositivas no cenário das síndromes metabólicas.
Para o Prof. Márcio Galvão, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), capacitar o profissional para que possa fazer educação em saúde e conhecer os marcadores metabólicos é fundamental para melhorar os desfechos clínicos na Atenção Primária à Saúde (APS). Ele argumenta que há dificuldade de acesso de grande parte da população a exames importantes para a qualidade do cuidado e que, muitas vezes, existe um hiato longo de tempo entre a primeira consulta médica, a realização do exame e o retorno ao médico. Nessas situações, o resultado do exame solicitado pode chegar desatualizado ao médico, e não ser mais útil. Uma das possíveis soluções para este problema, segundo ele, é investir nas tecnologias point of care, para possibilitar que esses os exames sejam feitos simultaneamente à consulta e o profissional de saúde possa fazer ajustes terapêuticos imediatos.
Apesar do panorama das síndromes metabólicas no Brasil ser bastante preocupante, alguns programas despontam como modelo de gestão para melhorar a saúde cardiovascular da população, como é o caso do HEARTS na Atenção Primária à Saúde em diferentes países das Américas. De acordo com o Dr. Andres Rosende, Consultor da OPAS/OMS para a iniciativa HEARTS nas Américas, “por meio de uma abordagem baseada em protocolos de tratamento padronizados, objetivos e simplificados é possível superar a maioria dos obstáculos que interferem na prevenção e gerenciamento da hipertensão”, entre eles a falta de diagnóstico, a demora no início do tratamento da terapia medicamentosa e a baixa retenção de acompanhamento das pessoas diagnosticadas com essa condição que, associada ao diabetes, aumenta significativamente a mortalidade cardiovascular.
Outro programa que vem apresentando resultados positivos é o Previne Brasil, criado em 2019 pelo Ministério da Saúde para tornar a APS mais resolutiva através de sete indicadores. Em 2019, o exame de hemoglobina glicada havia sido solicitado para menos de 500 mil pessoas, enquanto no segundo quadrimestre de 2022 foram mais de 2,5 milhões de solicitações. Já o número de pessoas com hipertensão arterial que foram atendidas em consulta e tiveram a pressão arterial aferida na APS saltou de menos de 1 milhão para quase 10 milhões. O Sr. Cristiano Soster, Assessor Técnico do Conselho Estadual dos Secretários Municipais de Saúde da Bahia (Cosems-BA), diz que o programa visa estabelecer vínculo e envolver os profissionais de saúde no atendimento a essa população. “O Previne Brasil estabelece uma nova cultura no processo de pagamento tanto dos gestores quanto dos trabalhadores da APS”, declara. Mas tendo em vista que todos os municípios que possuem APS aderem ao programa automaticamente, o Sr. Cristiano observa que o percentual de pessoas avaliadas ainda é muito baixo em relação à quantidade de pessoas com CCNTs: “menos de 1/4 das pessoas com hipertensão e 1/5 das pessoas com diabetes são atendidas em consulta e têm os exames realizados”. Nesse sentido, declara acreditar que o HEARTS poderá ajudar ainda mais a qualificar o atendimento considerando o acesso e estratificando o risco dessas pessoas para que tenham um acompanhamento mais qualificado.
A Coordenadora do Departamento de Saúde Pública da Sociedade Brasileira de Diabetes, Dra. Karla Melo, descreve a necessidade de melhorar a gestão de compras de medicamentos e insumos, mapeando a demanda de pessoas com diabetes por região e melhorar o manejo do diabetes, investindo em centros ou clínicas de atenção especializada, com equipe multidisciplinar. Ela resume dizendo que é necessário organizar o sistema e educar a população. Para o grupo de instituições que compõem o FórumDCNTs, incorporar novas tecnologias no sistema público de saúde, valorizar a união de todos os stakeholders dos diferentes setores, fortalecer os programas de educação nutricional e de prevenção às CCNTs também são estratégias importantes para mudar o panorama do diabetes e demais CCNTs no Brasil.
Fonte: www.ForumDCNTs.org