O olho seco interfere na produção e na qualidade das lágrimas, afetando a maioria dos pacientes submetidos à cirurgia de catarata. Especialista lista cuidados simples que melhoram o cotidiano de quem convive com esta condição
Em dezembro de 2019, às vésperas das celebrações de final de ano, a esteticista Norma Brabo foi diagnosticada com catarata. A doença, causada pelo descontrole do diabetes — recém-descoberto, afetou parcialmente a visão do olho direito e provocou perda significativa da visão do olho esquerdo.
Após uma jornada de idas e vindas às clínicas e consultórios médicos, a esteticista conseguiu agendar as cirurgias de catarata e desde abril de 2020, Norma convive com lentes intraoculares que substituíram os cristalinos opacificados nos dois olhos. “Foram dias difíceis. Conviver com a catarata nos traz momentos de angústia, porque eu quase perdi totalmente a minha visão, mas aprendi que é fundamental ter atenção redobrada com a saúde dos meus olhos. Hoje não saio de casa sem o colírio que levo na bolsa e que eu uso para lubrificar os olhos na correria do dia a dia”, explicou.
A história de Norma se confunde com as dos mais de 600 mil brasileiros que são anualmente submetidos à cirurgia de catarata, segundo dados do Conselho Brasileiro de Oftalmologia, referentes ao ano de 2019. O sucesso da reabilitação visual do olho afetado depende de diversos fatores, incluindo de doenças sistêmicas à doenças oculares associadas à catarata, e, embora cada caso tenha suas particularidades, uma condição em comum afeta todos os pacientes: a síndrome do olho seco pós-cirúrgica, observa o médico oftalmologista e professor Dr. Milton Ruiz Alves.
“É preciso deixar claro que cirurgias para a extração da catarata, correção dos vícios de refração (refrativa) e para o controle da pressão ocular (glaucoma), desencadeiam sintomas do olho seco no pós-cirúrgico. Se o paciente já sofre com essa condição o quadro poderá ser agravado, e se não possui terá que lidar com sintomas intensos do olho seco por pelo menos 90-180 dias. Isso porque esses procedimentos cirúrgicos alteram a inervação da córnea e desencadeiam inflamação, promovendo descamação celular (ceratite superficial) e redução da estabilidade da camada de lágrima que protege a superfície ocular. Por isso, os olhos vão arder, queimar e ocasionar flutuação e baixa de visão durante a recuperação”, explica.
O especialista destaca ainda que a síndrome do olho seco, causada por redução na produção ou por alteração na qualidade das lágrimas, provoca o ressecamento da superfície ocular e desencadeia sintomas que interferem diretamente na qualidade de vida dos pacientes, causando ardor, coceira, secura, sensação de “areia” nos olhos e fotofobia. “Em casos mais graves, quando não tratada adequadamente, essa condição compromete, inclusive, as atividades diárias, impactando negativamente a qualidade de vida”, destaca.
Ainda de acordo com o médico, o tratamento é viável e passa pela lubrificação dos olhos, que pode ser individualizada de acordo com as necessidades de cada paciente. Além disso, o médico destaca, também, que pacientes com doenças da superfície ocular, como blefarite, disfunção de glândulas meibomianas e olho vermelho pelo uso crônico de colírios hipotensores para o tratamento do glaucoma, já sofrem e tratam a síndrome do olho seco com a instilação de gotas de colírio lubrificante livre de conservantes, cujos frascos previnem a contaminação bacteriana durante o tratamento.
“Como desenvolver sintomas do olho seco é um resultado esperado nas cirurgias oculares, o ideal é agir preventivamente indicando aos pacientes a instilação de lubrificante artificial adequado, conhecido popularmente como colírio de “lágrima artificial”, nos 30 dias que antecedem a intervenção e estender seu uso até três meses após a cirurgia. Nosso papel como médico está não apenas no tratamento das enfermidades, mas também em levar bem-estar para pacientes, e essa é uma atitude simples que faz a diferença para as pessoas”, comenta o oftalmologista.
Segundo o especialista, essa condição não é particular da cirurgia de catarata. Ocorre, também, em procedimentos antiglaucomatosos, cirurgias refrativas, cirurgias para a correção de blefaroptose, cirurgias para correção do estrabismo e em resseção do pterígio ou de tumores da superfície ocular, entre outras. Para a maioria desses pacientes a indicação médica para a utilização de lubrificante artificial de forma rotineira contribui significativamente para o sucesso dos procedimentos.
“Esse é um cuidado que precisamos estender para todos os pacientes, já no pré-operatório da cirurgia de catarata, afinal estamos falando do procedimento oftalmológico mais realizado no Brasil e não desejamos que sintomas intensos do olho seco possam comprometer o sucesso da cirurgia e contribuir para que a expectativa dos pacientes não seja alcançada”, finaliza.