por Bruno Gallucci
No último dia 3 de agosto, o Senado Federal aprovou o projeto de lei de conversão da Medida Provisória 1.108/2022, que cria novas regras para o teletrabalho no Brasil. O texto, que agora depende da sanção do presidente da República, determina que o teletrabalho deve constar expressamente no contrato individual de trabalho. Essa relação contratual também poderá prever horários e meios de comunicação entre empregado e empregador, desde que garantidos os repousos.
Definido como a prestação de serviço fora das dependências da empresa, de maneira preponderante ou híbrida, que não configure labor externo, o teletrabalho já é uma realidade no Brasil. Dados coletados pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), com base na Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) e no IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), demonstram que 20,4 milhões de trabalhadores encontram-se em posições que poderiam ser realizadas de forma remota. O número diz respeito a 24,1% de toda população brasileira efetivamente ocupada. O contingente é responsável ainda por 40% do rendimento total do país, mostrando assim que essas profissões possuem ganho efetivo maior do que a média.
Importante destacar que o teletrabalho ganhou força após a chegada da pandemia do Covid-19 e a necessidade dos trabalhadores realizarem suas atividades profissionais em suas residências, principalmente nas fases mais críticas de disseminação do vírus.
As regras para o teletrabalho determinam que as empresas são obrigadas a dar aos empregados que atuam de maneira remota o mesmo tratamento dos que trabalham presencialmente, o que inclui o controle de jornada. A reforma trabalhista permitia que o teletrabalho não tivesse controle de jornada, o que dava flexibilidade às empresas para as contratações. Nesse ponto pode ser considerado um retrocesso da lei, pois se a ideia era flexibilizar a relação trabalhista, não deu certo.
Vale destacar que o tempo de uso de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessária, e de softwares, de ferramentas digitais ou de aplicações de internet utilizados para o teletrabalho, fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou em acordo ou convenção coletiva de trabalho, o que representa segurança jurídica. AMP privilegiou o princípio da autonomia individual na relação de trabalho, permitindo que empregados e empresas ajustem seus interesses.
Um ponto falho da MP é que não estabelece quem deve custear as ferramentas de trabalho como, por exemplo, energia elétrica, internet, equipamentos, mobiliários e outros. Importante dizer que a reforma trabalhista dispõe que o contrato deveria dispor sobre os custos de infraestrutura do empregado. A esperança é que essa nova regulamentação solidificasse essa regra, mas a MP não trouxe nada especifico nesse sentido. O que pode gerar dúvidas sobre esses custos e até gerar ações no Judiciário. O correto é que a empresa arque com essas despesas e que tudo seja discriminado contratualmente.
As novas regras incluídas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) são:
– Os empregadores são dispensados de controlar o número de horas trabalhadas por empregados contratados por produção ou tarefa;
– A presença do trabalhador no ambiente de trabalho para tarefas específicas, ainda que de forma habitual, não descaracteriza o trabalho remoto;
– O contrato poderá dispor sobre os horários e os meios de comunicação entre empregado e empregador, desde que assegurados os repousos legais;
– O uso de infraestrutura e ferramentas digitais pelo empregado fora da jornada não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver acordo;
– O regime de trabalho também poderá ser aplicado a aprendizes e estagiários;
– O regime de teletrabalho ou trabalho remoto não se confunde e nem se equipara à ocupação de operador de telemarketing ou de teleatendimento;
– O empregado admitido no Brasil que pratique teletrabalho fora do país está sujeito à legislação brasileira, exceto em caso de legislação específica ou acordo entre as partes;
– O empregador não será responsável pelas despesas ao retorno presencial do empregado que mora fora da sede, salvo acordo; e
– Terão prioridade no teletrabalho os empregados com deficiência e com filho ou criança de até quatro anos de idade sob guarda judicial.
Assim, o texto é omisso quanto à responsabilidade efetiva ou não do empregador sobre o fornecimento da infraestrutura básica e de ajuda de custo para a atividade regular do empregado em regime de teletrabalho. Portanto, por conta dessas lacunas, muitas dúvidas nessa relação devem permanecer e o Pode r Judiciário poderá ser a saída para a resolução sobre determinadas demandas envolvendo o trabalho de forma remota no Brasil.
Bruno Gallucci é advogado e sócio do escritório Guimarães e Gallucci Advogados