Enfrentar crises de ansiedade, sofrer alterações na alimentação e a preocupação em conseguir um emprego são pontos vivenciados pelo auxiliar de coordenação escolar, George Michael Reubler Vaz, de 31 anos. Em quase dois anos da pandemia de Covid-19, o profissional ficou desempregado por duas vezes por conta da crise econômica no País.
Quando perdeu os empregos, a aflição veio. Houve queda de cabelo, ansiedade em relação à comida e aumento na frequência cardíaca. “Meu emocional está muito abalado. Muitas vezes tenho problemas em dormir e quando durmo, acordo fatigado, como se o ar acabasse. Percebi muitas vezes as alterações em que fico bem, outras vezes choroso, nervoso, agitado”, descreveu George, que tem esposa e dois filhos. O auxiliar contou que, com o estresse emocional vivenciado neste ano, engordou bastante e hoje está com 114 quilos.
Atualmente, 13,5 milhões de brasileiros buscam emprego, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e, de acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), pesquisa realizada em 2020, entre seus associados, 67,8% responderam que receberam pacientes novos no início da pandemia que nunca haviam apresentado sintomas psiquiátricos anteriormente.
Janeiro Branco
Lidar com as emoções do desemprego em um cenário cuja pandemia afetou empregados e empresários é um processo que deve ser trilhado com ajuda profissional. Desde 2014, a campanha Janeiro Branco vem ganhando força com o objetivo de contribuir com a construção, o fortalecimento e a disseminação de uma cultura da saúde mental no Brasil. “Saúde mental não é só fazer terapia. É me autoconhecer, estar com quem eu quero, gosto, realizar coisas que me deixam feliz e bem. Em um momento de estresse quem me faz bem?”, questionou a psicóloga Ana Beatriz Sahium (CRP/09/13983), que atende na Clínica Mare, no centro clínico do Órion Complex, em Goiânia.
Para ela, cuidar da saúde mental é fazer com que o indivíduo se reconecte com o que é, estima, os programas que gosta de fazer. “Se isso não faz sentido, é preciso consultar um psicólogo para que ele mostre o que está acontecendo com o paciente”, ressaltou.
Ao conviver com o desemprego, é preciso investir em coisas que agreguem. “O profissional precisa de dinheiro para sobreviver e sustentar sua família. Nós vivemos em um país onde muita coisa está acontecendo. Com a convivência do desemprego, ele fica desestabilizado. É necessário reconhecer onde o profissional quer trabalhar, não parar de procurar uma vaga, e fazer terapia”, explicou a psicóloga.
Demissões
No início da pandemia, George passou pela primeira demissão após a escola onde trabalhava fechar com a suspensão das aulas. Cinco meses depois, conseguiu uma nova oportunidade, mas com o salário menor. “A última vez que encontrei um trabalho, em uma escola na Cidade Jardim, o salário era mais baixo por conta da crise sanitária e econômica”, lamentou.
No final de dezembro, mais uma vez, ele foi demitido. “Fiquei fora de mim, não tive autocontrole. Vivendo o desemprego, existe uma autocobrança, coloco-me como inferior e os questionamentos dos motivos em acontecer isso surgem a todo momento. Mas não posso ficar parado, comecei a enviar currículos e espero a minha oportunidade”, contou o auxiliar de coordenação escolar. Demonstrando preocupação em se recolocar no mercado de trabalho, George até procurou atendimento psicológico, mas por estar desempregado e sem dinheiro, encontrou dificuldades e acabou não fazendo o tratamento no momento. Porém, ele, que já fez psicoterapia quando teve depressão em 2008, ainda guarda muito do aprendizado, que tanto o ajudou, e hoje busca o autoconhecimento e pratica atividades lúdicas e reflexivas, que o têm ajudado a manter o equilíbrio nessa fase difícil.
“Eu busco muito o autoconhecimento e autocontrole, por meio da espiritualidade, e me esforço para manter o pensamento positivo. Outro método que busco é fazer atividades lúdicas, como brincar com meu filho menor, de 3 anos. Jogo futebol com ele e com o mais velho de 13. Também invisto na música, gosto de cantar no dia a dia e na igreja também, isso me ajuda a combater os pensamentos negativos e equilibrar os sentimentos”, relata ele, que não descarta procurar ajuda profissional caso os sintomas se intensifiquem.
Cuidados
A psicóloga Ana Beatriz afirma que é preciso não pensar tanto na parte negativa, o que pode acontecer. “Temos que viver o novo normal, pensar positivo para que nessa busca por um novo trabalho, o resultado seja alcançado”, destacou. Ser escutado, admirado, estar vivo são abordagens as quais a psicóloga identifica como oportunidades de cuidado da saúde mental para toda vida.
Houve uma intensificação na procura de serviços profissionais de cuidado com a saúde mental por conta da pandemia, de acordo com a psicóloga. “Os pais estão adoecidos por pensarem no emprego, na saúde, no dinheiro, na manutenção da casa. E as crianças não sabem o que está acontecendo. Por estarem mais em casa houve problemas de comportamento, mudanças. É preciso um convívio escolar. Convivendo somente com adultos é de se estranhar”, concluiu a psicóloga.