São Paulo, 14 de junho de 2021 – A automedicação no Brasil é um hábito que pode trazer sérias consequências para a saúde. E quando o assunto é a visão, o resultado do uso de colírios a base de corticoides, sem a prescrição de um oftalmologista, pode ser a cegueira irreversível causada pelo glaucoma.
O glaucoma é uma designação genérica de um grupo de doenças oculares distintas que provocam danos ao nervo óptico e perda da visão. O glaucoma pode ser classificado em secundário quando é possível identificar o fator que desencadeou o desequilíbrio da pressão intraocular.
E uma das formas de glaucoma secundário é causada pelo uso indiscriminado de colírios à base de corticoide. Estima-se que pelo menos um terço dos casos de glaucoma secundário seja consequência da automedicação com esses fármacos.
Colírio usado deve ser descartado
Segundo Dra. Maria Beatriz Guerios, oftalmologista especialista em Glaucoma, os medicamentos à base de corticoides são inestimáveis para diversas especialidades médicas, incluindo a Oftalmologia.
“A maioria dos colírios que trata doenças oculares tem em sua composição corticoides. Entretanto, a dose e o tempo de tratamento devem ser seguidos à risca. Após o término, é preciso descartar o frasco do colírio”.
“Entretanto, muitas pessoas guardam os colírios para uso posterior, em situações de olho seco ou para uma irritação ocular, por exemplo. E é exatamente esse fato que pode levar ao desenvolvimento do glaucoma induzido por corticoides”, alerta Dra. Maria Beatriz.
O perigo oculto dos corticoides
Os corticoides, também chamados de cortisona ou corticosteroides, são uma classe de fármacos sintéticos, com uma potente ação anti-inflamatória. Foram usados pela primeira vez nos Estados Unidos, em 1912. A primeira descrição de um glaucoma induzido por um corticoide foi feita em 1950.
“Os corticoides geram alterações na drenagem do humor aquoso. Como resultado, a pressão intraocular (PIO) aumenta. Essa resposta aos corticoides pode ocorrer algumas semanas ou alguns dias após a aplicação dos colírios que contêm esses fármacos”, explica Dra. Maria Beatriz.
Como o glaucoma é uma doença silenciosa, esse aumento da PIO pode causar danos permanentes no nervo ótico. Essas lesões podem, finalmente, levar à cegueira irreversível.
“Vale ressaltar que além dos colírios, qualquer outro medicamento de uso tópico que contenha essa classe terapêutica em sua composição, aumenta o risco de desenvolver o glaucoma induzido por corticoides. Sprays nasais, pomadas e cremes são alguns exemplos”, diz a médica.
Grupos de risco
A elevação da PIO induzida por corticoides pode ocorrer em qualquer faixa etária, em qualquer pessoa. Contudo, há certas condições que aumentam o risco de desenvolver a condição.
– Pacientes com glaucoma primário de ângulo aberto (GPAA)
– Indivíduos sem diagnóstico de glaucoma, classificados como respondedores fortes para corticoides (aqueles que ao usarem corticoides, respondem acima do esperado)
– Parentes de primeiro grau de pacientes com GPAA
– Alta miopia
– Crianças abaixo de 10 anos de idade e pessoas acima de 60
– Diabetes mellitus
– Artrite reumatoide
– Hipercortisolismo endógeno
Tratamento
Quando o uso do colírio a base de corticoide é interrompido a tempo, a pressão do olho tende a voltar ao normal. Porém, pessoas que usam esses colírios, de forma frequente, têm um risco muito alto de desenvolver o glaucoma e perder a visão.
“O principal motivo é que o glaucoma é uma doença silenciosa. Quando há alguma manifestação, é bem provável que a doença esteja num estado avançado”, lamenta a especialista.
Um estudo apontou que cada semana de uso de corticoides, em média, ao longo da vida, leva a um risco 4% maior desse tipo de glaucoma. Por isso, as pessoas dos grupos de riscos devem evitar, ao máximo, usar medicamentos dessa classe.
De acordo com a oftalmologista, quando o uso do corticoide, seja em forma de colírios ou tópico, é necessária, é preciso fazer um acompanhamento oftalmológico regular para medir a PIO.
“Vale lembrar também que o uso indiscriminado de medicações à base de corticoide também pode acelerar o processo de desenvolvimento de uma catarata”.
O tratamento do glaucoma visa interromper a progressão da doença, ou seja, evitar que a visão seja prejudicada de forma irreversível.
Colírios, laser, implante de válvulas ou Stents, cirurgias filtrantes e uso de tubos de drenagem são tratamentos possíveis para o glaucoma. A finalidade de todas as técnicas é diminuir a pressão intraocular.
“Cada caso deve ser avaliado individualmente para a indicação do tratamento mais apropriado. Por ser uma doença crônica, o acompanhamento regular com um Oftalmologista é fundamental”, finaliza Dra. Maria Beatriz.
Nem é preciso dizer que a principal forma de prevenir o glaucoma induzido por corticoides é jamais usar qualquer colírio sem prescrição médica. Lembre-se de descartar o colírio após o término do tratamento.