São Paulo, 6 de outubro 2020 – Andar na ponta do pé na infância é mais comum do que se imagina. Felizmente, na maioria dos casos, é uma condição benigna que tende a se resolver espontaneamente. Segundo a fisioterapeuta Walkíria Brunetti, especializada em fisioterapia neurológica, o termo médico para essa condição é marcha em pontas idiopática.
A condição é caracterizada pela falta de contato do calcanhar com o chão, na fase inicial da marcha. Normalmente, aparece durante o desenvolvimento da marcha e persiste após os dois anos de idade.
“Além disso, a marcha em pontas ocorre em crianças com desenvolvimento psicomotor normal. Essas crianças, portanto, são capazes de realizar o apoio da planta do pé no chão por completo, mas não o fazem”, comenta Walkíria.
Muito comum
A marcha em pontas idiopática tem uma incidência de 7 a 24% na população pediátrica. Muitos pais procuram ajuda especializada quando percebem que os bebês começam a andar nas pontas dos pés, sendo esse um dos principais motivos de consultas com neuropediatras.
Para Walkíria, isso é importante, pois esse padrão de marcha pode ser um sinal de algumas patologias, como paralisia cerebral, distrofia muscular ou ainda do autismo. Entretanto, a boa notícia é que na maioria dos casos não tem ligação com outras condições neurológicas.
“Outra característica importante é que a criança anda na ponta dos dois pés, ou seja, é bilateral. Para o diagnóstico, é preciso ainda que tenha uma duração superior a três meses. Assim, caso a criança ande de vez em quando, não é preciso se preocupar”, reforça Walkíria.
Curiosamente, estudos apontaram que crianças cujos pais ou familiares de primeiro ou segundo grau tenham tido esse padrão de marcha na infância, têm maior chance de desenvolver a marcha em pontas. Outro estudo mostrou ainda que é mais prevalente nas crianças com predominância da mão esquerda, ou seja, nas canhotas.
Tropeços frequentes
A origem da marcha em pontas é desconhecida, por isso é chamada de idiopática. “Mesmo sendo uma condição benigna, é preciso corrigir a marcha. A repetição do movimento pode causar dores nos membros inferiores, levar a criança a cair ou a tropeçar de forma frequente e dificultar as atividades esportivas. Nos mais velhos, pode ser ainda um motivo para o bullying na escola”, ressalta Walkíria.
“A terapia é importante, pois se a criança começa a crescer com o calcanhar no ar, pode ocorrer encurtamento do tendão de Aquiles, dos músculos posteriores do joelho e da coluna. Também pode desenvolver um padrão de marcha que leva o tronco para frente, pois quando nós levantamos a ponta do pé damos um impulso para frente”, explica a fisioterapeuta.
Defensividade tátil: uma possível causa
Mais recentemente, os especialistas têm sugerido que andar na ponta dos pés pode estar relacionado a déficits no processamento das informações sensoriais do sistema tátil. Algumas crianças desenvolvem respostas negativas ou até mesmo aversivas a algumas situações que demandam o tato.
“Cortar ou pentear o cabelo, cortas as unhas, usar roupas com etiquetas, pisar em pisos mais ásperos, andar sem calçados ou comer certos alimentos mais pastosos, por exemplo, são algumas atividades que podem ser impossíveis para essas crianças”, diz Walkíria.
Como andar na ponta dos pés pode ter ligação com o sistema de integração sensorial, umas das terapias mais usadas é a terapia de integração sensorial. “Durante as sessões são criados estímulos para as necessidades individuais de cada paciente. Costumamos usar cama elástica, rampas, balanços, túneis de tecido e escorregadores, entre outros instrumentos”, comenta a especialista.
O tratamento envolve a correção da marcha, bem como ajudar a criança a se adaptar melhor às sensações táteis.